"Vivia em uma pequena aldeia chinesa o Mestre Chan, famoso por seus conhecimentos do estilo Shaolin, do estilo Tong Long, por sua habilidade nas técnicas dos Oito Deuses Bêbados e pelo domínio da Palma de Ferro e das dezoito armas chinesas. Em sua juventude havia sido um invejoso, sempre caluniando outros mestres que tinham conseguido mais fama que ele.
Apesar de toda a sua habilidade no Kung Fu, sua maior arma ainda era a fofoca, a maledicência, o desprezo. Seus alunos, por confiarem nele, acreditavam que tudo que dizia era verdadeiro e passaram também a desprezar os outros mestres. Esses outros mestres sabiam do procedimento do mestre Chan, mas não lhe queriam mal, simplesmente tinham pena dele. Quando os discípulos desses mestres lhes perguntavam a respeito do Mestre Chan, estes lhes respondiam que se tratava de um mestre muito valente, pena que fosse tão infantil e não soubesse respeitar a seus colegas.
Alguns mestres chegavam mesmo a recomendar sua escola a pessoas que moravam próximas à sua região, recomendação essa que Mestre Chan seria incapaz de fazer a respeito deles. A valentia de Mestre Chan era muito grande. Certa vez entrou sozinho na caverna de um grande urso negro que assustava a população da vila, enfrentando a fera e saindo de lá com ele morto. Certo dia estava andando pela rua quando um ancião se aproximou dele e lhe disse:
- O senhor é um grande mestre e possui habilidades espantosas, mas por que, ao invés de perder tempo falando mal de outros mestres, o senhor não enfrenta os três monstros que estão assustando o povo? Mestre Chan estranhou a interpelação e perguntou quais eram os três monstros. O ancião explicou que havia um grande tigre rondando o povoado e que já havia comido três homens.
Mestre Chan pegou suas armas e saiu em busca do tigre, matando-o a golpes de lança e punhal. Voltou ao povoado, procurou o ancião e lhe disse: - Já matei o tigre, qual é o próximo monstro? O ancião lhe contou que havia uma grande serpente que se ocultava
no caminho da aldeia atacando os viajantes. Mestre Chan pegou sua corrente articulada e foi atrás da serpente, matando-a. Quando voltou à aldeia perguntou ao ancião qual era o terceiro monstro.
O ancião respondeu:
- Você é o terceiro monstro. Mestre Chan ficou furioso e ergueu seu poderoso punho para fulminar o pequeno ancião. Mas o ancião continuou a falar: - Você é um grande mestre, para você é muito fácil me tirar a vida, minha técnica não é suficiente para enfrentá-lo, mas mesmo que você me mate continuará sendo o terceiro monstro, pois sua língua é ferina e venenosa e o mal que ela faz apaga todo bem que sua arte consegue fazer.
Mestre Chan abaixou seu punho e foi-se embora, passou toda a noite pensando, no dia seguinte juntou algumas roupas e caminhou até a montanha onde meditou durante três meses. Enquanto meditava na montanha reparou que quando o vento forte derrubava os troncos vigorosos e acariciava as folhagens flexíveis, a chuva matava a sede dos dois. Compreendeu que a chuva era mais sábia que o vento, e que todas as pessoas, boas ou más, com grandes ou com medíocres conhecimentos, continuavam a merecer a luz do Sol e a água da chuva.
Retornou à aldeia e o povo de lá ficou surpreso quando viu que havia se modificado, suas maneiras eram as de um homem cortês e se comportava com amabilidade em relação a todos os outros mestres, mesmo com aqueles a que julgava ser superior."
Fonte: O "Espírito Marcial" - Marcos Natali (Editora Ediouro)
Fonte: O "Espírito Marcial" - Marcos Natali (Editora Ediouro)
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